Depois de em 2019 ter editado o trabalho “Ementa das Almas (Loriga, 2019)”, eis agora que vê a luz do dia este segundo volume dedicado a esta ancestral tradição religiosa, vivida na época da Quaresma.
Como nos refere Joaquim Pinto Gonçalves, num excelso artigo sobre a Amenta das Almas no Portal do Folclore Português (
folclore.pt/ementa-almas-quaresma-loriga/#gsc.tab=0):
“Na etnografia de Loriga a existência da “Amenta das Almas” é uma tradição muito antiga, perdendo-se mesmo na noite dos tempos, e que se vem mantendo de geração em geração.
Esta prática religiosa tem lugar na noite de Sábado para Domingo, durante a Quaresma depois da 02h00 da manhã.
Antes dessa hora os “Penitentes” começam por se reunir no Adro da Igreja. Pouco depois e, enquanto alguns sobem para a torre da Igreja, outros espalham-se pela vila em pontos altos que lhes possibilite ver a torre, para travarem um “duelo” de cantos, onde evocam e louvam a paixão e morte de Jesus e a salvação da Almas.
No silêncio da noite, os cânticos ecoam pela Vila, acordando os crentes que começam a rezar.
Por meio de badaladas no sino da torre da Igreja anuncia-se a cerimónia.”
O trabalho que aqui se apresenta segue a ordem cronológica das gravações, com inicio na “Preparação” para a Amenta ou Ementa das Almas, no adro da igreja, subida à torre da igreja, reencontro do grupo de cantares novamente no adro da igreja e arruada (ou “Passos” ou “Via Sacra”) pelas ruas da vila de Loriga.
A segunda parte deste trabalho é a gravação integral do Encontro de Cantares da Amenta das Almas, na Igreja Matriz de São Romão, a 1 de abril de 2023.
Voltamos a Joaquim Pinto Gonçalves:
"“Ementar” ou “Amentar” as Almas?
Outra das pistas que seguimos leva-nos à origem do nome deste ritual.
Em Loriga, desde crianças, habituámo-nos a ouvir falar da “Ementa das Almas“. Todos aqueles que cumpriam este ritual a ele se referiam desta forma. No entanto, a partir de uma certa altura, começou a constar em Loriga que o termo correcto seria “Amenta” e não “Ementa“.
O curioso desta questão é que uns e outros podem estar certos porque ambos os termos existem e com significados similares.
Segundo Sousa Viterbo (*), “amentar“, quer dizer: “Quando os pastores da Igreja rezam pelos defuntos“.
No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora a palavra “amentar” surge com o significado de “Encomendar as Almas“. No entanto, não quisemos ficar por aqui e fomos procurar a origem das palavras e chegámos a interessantes conclusões.
Segundo o Dicionário Etimológico a palavra “amentar“, do Latim amentare, surge pela primeira vez na língua Portuguesa no séc. XVIII e com o significado de “prender com correias, atar”.
A mesma fonte refere a palavra “amentar“, como tendo origem em mente (lat. Mens mentis) com o significado de intelecto, alma espírito, do Latim Amens amentis com o sentido de que perdeu a mente.
Origem etimológica do termo “ementar”
Mas o mais curioso desta nossa procura é que do ponto de vista da origem etimológica do termo, fomos encontrar o termo “ementar”, também relacionado com mente, como tendo surgido na Língua Portuguesa pela primeira vez no séc. XIII com o significado de recordar.
Perante estes factos poderemos afirmar que termo “Ementar” é o que vem ao encontro da nossa tese de situar o início deste ritual na Idade Média. Por outro lado, os participantes que há duas décadas atrás diziam que estavam a “Ementar as Almas”, estavam, do ponto de vista do português, cobertos de razão.
Afinal o que é este ritual senão o recordar as almas do purgatório?
Assim, no caso de Loriga, é mais correcto dizer a “Ementa das Almas” e não “Amenta das Almas“."
Luís Antero
03.2024